quarta-feira, 23 de junho de 2010

Governo Lula deve ser primeiro a liberar arroz transgênico da Bayer no mundo



O arroz transgênico está na pauta de votação da Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBio), nesta quinta feira (24/6).

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Leia manifesto assinado por diversas organizações e movimentos sociais, como o MST e a Via Campesina, que denuncia o que está em jogo no debate sobre a aprovação do arroz transgênico
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ENTENDE O QUE ESTÁ EM JOGO COM O ARROZ TRANSGÊNICO

Dentro de poucos dias o Brasil pode se tornar a cobaia do mundo, ao permitir o plantio e o consumo de arroz transgênico não aprovado em nenhum país.

O pedido da empresa alemã Bayer está praticamente pronto para ser votado pela Comissão Técnica Nacional de Biossegurança – CTNBio. Trata-se do Arroz Liberty Link LL 601, resistente ao herbicida glufosinato de amônio (processo 01200.003386/200379).

Neste caso, até os produtores e a Embrapa Arroz e Feijão estão contra. Parece que só a CTNBio está do lado da Bayer. Como vai se posicionar o governo Lula?

Arroz com herbicida – riscos para a saúde

A modificação genética torna o arroz resistente ao herbicida de princípio ativo glufosinato de amônio e nome comercial Basta ou Finale (ambos da Bayer). Ou seja, não há nenhum benefício para o consumidor. Pelo contrário.

Com a resistência ao agrotóxico, a pulverização se dará sobre toda a lavoura, inclusive sobre o próprio arroz, que não morrerá mas absorverá o veneno, que irá também para os grãos.

O glufosinto é considerado tóxico para mamíferos e por este motivo será proibido na União Europeia a partir de 2017 por determinação do Parlamento Europeu [1].

Pesquisadores japoneses mostraram que a substância pode dificultar o desenvolvimento e a atividade do cérebro humano, provocando convulsões em roedores e humanos [2].

A Bayer é a empresa que mais vende agrotóxicos no Brasil e sua aposta no arroz transgênico visa ampliar ainda mais esse mercado.

A venda casada com o glufosinato reforça a posição do Brasil como principal destino de produtos tóxicos não mais aceitos em outros países [3].

Problemas agronômicos – a posição da Embrapa

Em audiência pública, o pesquisador Flávio Breseghello, da Embrapa Arroz e Feijão, apresentou a posição oficial “autorizada pela presidência”, frisando que a empresa não é contra os trangênicos e nem contra a modificação genética do arroz, mas que neste caso o produto da Bayer “agravará os problemas já existentes”.

“Não devemos usar tecnologias que terão validade de poucas safras”, disse Breseghello.

O principal entrave técnico enfrentado pelos produtores de arroz é o controle do arroz vermelho, espécie ancestral do arroz comercial, que compete com a cultura.

A preocupação é a constatação de que a planta transgênica inevitavelmente cruzará com sua parente vermelha, dando origem a arroz vermelho transgênico resistente a herbicida. O arroz vermelho pode germinar após mais de anos de dormência no solo. Segundo Breseguello, “a contaminação é irreversível” [4].

Problemas econômicos – a posição dos produtores

Na mesma audiência pública, os representantes dos produtores de arroz também manifestaram sua preocupação. Receiam perder mercado interno e externo caso a variedade seja liberada.

“Considerando que não existe consumo corrente nem mercado global para o arroz transgênico, concluímos que a entidade não é favorável nesse momento à liberação”, disse Renato Caiaffo Rocha, em nome dos produtores reunidos na Farsul e na Federarroz e do Instituto Rio Grandense do Arroz – IRGA.
Contaminação inevitável

Mais de 7 mil produtores de arroz processam a Bayer nos Estados Unidos por prejuízos sofridos pela contaminação de suas colheitas pelo arroz Liberty Link. A Justiça estadunidense já determinou o pagamento de mais de 50 milhões de dólares como indenização por danos materiais.

A Justiça do estado de Arkansas determinou também indenização por danos morais por entender que houve má fé por parte da empresa [5].

Entre 1999 e 2001, a empresa realizou nos Estados Unidos testes de campo com o arroz modificado, mas não chegou a propor sua liberação comercial.

A contaminação só foi descoberta cinco anos após a conclusão dos experimentos, quando o mercado europeu suspendeu as importações do produto. O Japão seguiu o mesmo caminho.

Na ocasião, a empresa eximiuse de qualquer responsabilidade pelo ocorrido, alegando tratarse de “circunstâncias inevitáveis, ato de Deus e negligência dos agricultores” [6].

Recentemente, um repesentante da Bayer no Brasil afirmou que o problema não está na contaminação, mas sim no fato de ela não estar prevista e regulamentada pelas leis de biossegurança.

Para André Abreu, enquanto permanecer um regime de intolerância (sic) em relação à contaminação, problemas como esse continuarão acontecendo [7].

Falta transparência

Muitos questionamentos foram apresentados por pesquisadores, produtores e representantes da sociedade civil na audiência publica realizada em março de 2009, mas até hoje nenhum deles foi respondido.

Não se sabe, por exemplo, o que a empresa pretende fazer para evitar a contaminação do arroz comum nem qual o nível previsto de resíduo de agrotóxico no grão.

A CTNBio nega acesso aos dados apresentados pela empresa. Essa falta de transparência é prejudicial à participação da sociedade, à biossegurança e à saúde pública.

Falta isenção – a avaliação pela CTNBio

Até hoje a CTNBio aprovou todos os pedidos a ela submetidos. Nunca recusou nenhum. Suas decisões ocorrem por maioria simples, isto é, 14 de 27 votos.

Cabe destacar que é grande a controvérsia técnica dentro da própria Comissão. O melhor exemplo está no fato de que até hoje todas as aprovações tiveram votos contrários fundamentados dos ministérios da Saúde, Meio Ambiente e Desenvolvimento Agrário.

Anvisa e Ibama apresentaram formalmente recursos técnicos contra as liberações dos milhos LL da Bayer, MON810 da Monsanto e Bt 11 da Syngenta, mas o governo Lula delegou à CTNBio a decisão. Pior para todos nós que teremos produtos contendo esses milhos transgênicos, apesar da discordância da ANVISA e do IBAMA.

A falta de imparcialidade começa pelo próprio presidente da Comissão, que ao assumir o cargo no início deste ano já se declarou favorável à liberação do arroz transgênico [8], contra a rotulagem dos produtos [9] e a favor da exclusão do monitoramento dos impactos à saúde dos transgênicos.

Antes de ser presidente, para defender a soja transgênica da Monsanto, Edílson Paiva, falando do glifosato usado na soja da Monsanto, chegou a dizer que os “humanos poderiam até beber e não morrer porque não temos a via metabólica das plantas” [10].

Alterações genéticas imprevistas

O método de transformação utilizado para o arroz Liberty Link foi o da aceleração de partículas (biolística). A biolística é um método de transferência direta que consiste em projetar transgenes dentro das células alvo através de partículas de ouro ou tungstênio cobertos com moléculas de DNA recombinante (transgenes) aceleradas por um sistema de propulsão por hélio.

Neste método, há total descontrole do local da inserção dos transgenes nas células e genoma vegetal. O transgene pode tanto ser inserido no genoma nuclear quanto no DNA de organelas.

Além disso, o número de transgenes também não é controlado. Várias partículas podem integrarse
no genoma e em diferentes lugares. Finalmente, a integridade do transgene (sua sequência genética) também pode não ser mantida, ou seja, o transgene pode integrarse no genoma de forma truncada, com deleções ou ainda com inserções de fragmentos de DNA da própria célula entre os transgenes.

No caso do arroz LL, nenhum estudo cientificamente robusto foi apresentado pela proponente a fim de confirmar o que foi inserido. Isto significa que sequer temos a certeza do que foi inserido, muito menos das conseqüências.

Durante a audiência pública, um participante mencionou a possibilidade de ter ocorrido deleção de um nucleotídio (Adenina) no local de regulação da expressão da proteína que confere a tolerância ao herbicida glufosinato de amônio. Posteriormente à audiência, a empresa admitiu a deleção, afirmando haver a alteração de um aminoácido na proteína.

Essa alteração significa que a proteína produzida pelo arroz difere daquela produzida naturalmente pela bactéria Streptomyces, doadora do gene. No entanto, nenhum estudo foi apresentado a fim de investigar possíveis efeitos adversos na saúde humana e meio ambiente resultantes dessa alteração não intencional. Ou seja, além da incerteza do que foi realmente inserido, ignora-se uma alteração genética detectada, mas não esperada. A proteína não perdeu a sua função de conferir a tolerância ao herbicida, mas pode gerar riscos não analisados.

A decisão está nas mãos do governo Lula

A Lei de Biossegurança (Lei 11.105/05) criou uma instância acima da CTNBio, o Conselho Nacional de Biossegurança, formado por 11 ministros e presidido pela Ministra Dilma Rousseff. O CNBS tem o poder de dar a última palavra em relação a uma liberação comercial de transgênico no país.

Até o momento, a atuação do CNBS foi lamentável: deu razão à CTNBio e autorizou a liberação dos três milhos transgênicos que a ANVISA e o IBAMA recomendaram que não fossem autorizados.

A liberação do arroz LL tem também implicações econômicas bem graves, estando as principais entidades representativas dos produtores contra (Farsul, Federarroz e Instituto Rio Grandense do Arroz – IRGA). Como vai se posicionar o governo Lula: a favor da Bayer ou do Brasil?

Assinam este documento:

AAO Associação de Agricultura Orgânica
ABRANDH – Ação Brasileira pela Nutrição e Direitos Humanos
ACAN Associação Catarinense de Nutrição
AEPAC Associação Estadual dos Pequenos Agricultores Catarinenses
ANA Articulação Nacional de Agroecologia
ANAC – Associação Nacional de Agricultura Camponesa
ANPA - Associação Nacional dos Pequenos Agricultores
APATO Alternativas para a Pequena Agricultura no Tocantins
APPA Associação Paranaense de Pequenos Agricultores
ARPA Associação Riograndense de Pequenos Agricultores
ASPTA Agricultura Familiar e Agroecologia
Cooperfumos Cooperativa Mista de Fumicultores do Brasil
CONESANGO Conselho Estadual de Segurança Alimentar e Nutricional de Goiás
CONSEASC Conselho Estadual de Segurança Alimentar e Nutricional de Santa Catarina
CPCPR Cooperativa Mista de Produção e Comercialização Camponesa do Paraná Ltda
CPCRS Cooperativa Mista de Comercialização Camponesa do Rio Grande do Sul
FASE Federação de Órgãos para a Assistência Social e Educacional
FBSSAN - Fórum Brasileiro de Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional
FEAB Federação dos Estudantes de Agronomia do Brasil
FESANSMS Fórum Estadual de Segurança Alimentar e Nutricional Sustentável do Mato Grosso do Sul
FNECDC Fórum Nacional das Entidades Civis de Defesa do Consumidor
FOSANES Fórum de Segurança Alimentar e Nutricional do Espírito Santo
IDEC Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor
Instituto Cultural Padre Josimo
MAB Movimento dos Atingidos por Barragens
MMC Movimento de Mulheres Camponesas
MPA Movimento dos Pequenos Agricultores
MST Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra
PJR Pastoral da Juventude Rural
RECIDGO Rede de Educação Cidadã de Goiás
Terra de Direitos
Via Campesina

Notas:

[1] EU Environment Ministers Keep Bans on Transgenic Maize. Environment News Service (ENS). http://
www.ensnewswire.
com/ens/mar2009/2009030201.
asp
[2] Nobuko Matsumura, Chizuko Takeuchi, Keiichi Hishikawa,Tomoko Fujii, Toshio Nakaki. Glufosinate
ammonium induces convulsion through Nmethyldaspartate
receptors in mice. Neuroscience Letters 304
(2001) 123125.
[3] Brasil é o principal destino de agrotóxico banido no exterior. O Estado de São Paulo, 30 de maio de
2010.
[4] A transcrição da audiência pública realizada em 18 de março de 2009 está disponível na página eletrônica
da CTNBio, no endereço http://www.ctnbio.gov.br/index.php/content/view/13289.html
[5] Bayer ordered to pay farmer $1 million is tab for modified rice. Arkansas DemocratGazette,
10/03/2010. http://www.allbusiness.com/legal/tortsdamages/
140796811.
html ;
Bayer to pay $1.5 mln in 2nd lawsuit over GM rice, Reuters, 05 de fevereiro de 2010.
http://www.reuters.com/article/idUSLDE61421W20100205 e GM rice litigation: defense. Delta Farm Press,
04 de maio de 2010. http://deltafarmpress.com/rice/gmricelitigationdefense0504/
[6] Firm Blames Farmers, 'Act of God' for Rice Contamination. Washington Post, 22 de novembro de 2006.
http://www.washingtonpost.com/wpdyn/
content/article/2006/11/21/AR2006112101265.html
[7] Mesa redonda sobre arroz transgênico. CTNBio, 19 de maio de 2010, Brasília.
[8] Novo presidente da CTNBio defende arroz transgênico. O Estado de São Paulo, 11 de fevereiro de 2010.
http://www.estadao.com.br/noticias/geral,novopresidentedactnbiodefendear...,
509722,0.htm
[9] Novo presidente da CTNBio se diz contra rotular transgênico. Folha de São Paulo, 11 de fevereiro de
2010. http://www1.folha.uol.com.br/folha/ciencia/ult306u692636.shtml
[10] Avanço da soja transgênica amplia uso de glifosato. Valor Econômico, 24 de abril de 2007


Fonte: www.mst.org.br


http://www.blogecossocialistas.blogspot.com/

Um comentário:

  1. TAnia Jamardo Faillace27 de junho de 2010 às 08:02

    Pergunto tanto aos eco-socialistas, como aos ambientalistas em geral, por que não são elaboradas propostas sustentáveis para todos os setores da economia e dos equipamentos sociais?
    Em 1970,com o Congresso de EStocolmo, tornou-se público, o que já se discutia sobre a questão ambiental/ecológica : a Ecologia sendo encarada como uma ciência das totalidades, isto é, da interação das forças naturais e dos entes vivos, assuntos antes considerados românticos.
    Desde muito cedo, também, foram discutidos sociedade humana e Ecologia, isto é, uma forma de compatibilizar fatos sociais (e econômicos) com a dinâmica geral da vida e das condições materiais do planeta.
    O que é que aconteceu, desde então?
    Houve uma queda de qualidade,e o que deveria ser uma proposta inteligente e viável para orientar e redirecionar os empreendimentos humanos de forma equilibrada com os recusos naturais, transformou-se numa longa série de críticas de caráter epidérmico e marqueteiro, nem todas baseadas em comprovações rigorosas e sim, muitas vezes, orientadas pela possibilidade de criar mais um mercado "ecológico".
    Há queixas e requeixas, manifestações (hoje menos), mas não há trabalho prático, tanto ao nível de alternativas conseqüentes para a sociedade humanas, como para a criação de uma consciência ecológica, que vá além de não jogar lixo na rua.
    Pelo contrário, baseado em queixas e requeixas, alguns aspectos mais odiosos do capitalismo imperialista voltam a ter voz, como o NEOMALTUSIANISMO, que já é artigo de fé do Governo Mundial.
    Um neomaltusianismo, que, embora se auto-intitule de preservacionista, prega a extinção de populações humanas, animais e vegetais.
    Uma visão ecológica é inseparável de uma proposta de socialismo radical. Ou permanece como bate-papo informal, e abertura de novos negócios capitalistas.
    TAnia Jamardo Faillace
    escritora e jornalista de Porto Alegre - RS

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